Assiste-se no âmbito da
IPB a uma preocupante tendência advinda de certos discursos. O blog
“tempora-mores”, por exemplo, de grande audiência não só na IPB, mas
especialmente nela, até porque é a fonte de textos que frequentemente ocupam as
indicações de leitura no site da própria igreja, postou dois textos defendendo
de forma explícita a censura. O blog tece críticas a programações televisivas
que não respeitariam decência ou moralidade, o que exporia crianças a exemplos
de comportamento de exacerbada sensualidade, vocabulário reprovável, incentivo
a vícios etc. No entanto, conquanto nós, do Princípio Protestante, sejamos
amplamente favoráveis a uma regulação da mídia, não podemos deixar de apontar o
perigo existente em uma defesa tão cristalina da ideia de “censura”. Se por
mais não fosse, somente a associação que a palavra “censura” promove com a
recente história brasileira em seus “anos de chumbo” já seria motivo suficiente
para sua crítica. Censura é algo que se faz por meio da força, não do debate
democrático, forma legítima de se lutar por programações televisivas de maior
qualidade; é coerção de ideias e impedimento à livre manifestação individual
(já legalmente reprimida quando incorre em crime). Censura, no Brasil, obrigou
muita gente a se calar, a sair do país, a cercear sua manifestação artística. A
defesa do uso do termo de maneira tão explícita só é possível para quem nutre
simpatias com regimes totalitários, para quem, em nome da “moral e dos bons
costumes” e dos “valores tradicionais da família” não hesitaria em apoiar um
governo militar. Além disso, é flagrante a contradição desse discurso
conservador, quando prega um Estado mínimo em questões econômicas – aquelas
que, portanto, atacariam de forma frontal a gritante injustiça social em nosso
país – mas defende sua presença de maneira impositiva em questões morais, como
quando espera que ele legisle sobre o aborto e a censura.
Um outro blog, dessa
vez de Norma Braga, palestrante que ganha cada vez mais espaço em congressos
promovidos por entidades evangélicas, postou um texto que trata o período da
Ditadura Militar no Brasil como “um mal menor”, diante da ameaça de
“terroristas treinados” que rondaria o país. Não faltaram comentários
entusiasmados a suas ideias, o que mostra que o apoio à Ditadura no Brasil não
está restrito aos círculos militares. Braga não deixou de criticar duramente os
jovens que protestaram contra a
comemoração realizada recentemente em um clube militar por ocasião de mais um
aniversário da instauração da “revolução” de 64 no Brasil. Em seu texto,
defende um debate sobre o tema da ditadura que não apele para radicalismos, mas
não deixa de classificar gente como Fidel Castro de “demônio” e confessa nutrir
“pouco, mas muito pouco respeito mesmo” por quem defenda ideais
comunistas.
Junte-se a esses dois
exemplos os discursos cada vez mais recorrentes sobre a “imoralidade nunca
vista antes de forma tão desmedida” ou o “solapamento dos valores da família” e
ainda “a escancarada perversão dos costumes”, frequentes em púlpitos e no
programa “Verdade e vida” da IPB (queixas recorrentes em discursos moralistas
de todos os tempos), e teremos a reprodução cada vez mais fiel do mesmo clima
social que apoiou o Golpe de 64. Havia, na época, o mesmo clamor pelos “valores
da família”, prato cheio para os milicos que se apresentaram como a salvação do
país contra os “terríveis comunistas” que supostamente ameaçavam até mesmo a
existência de igrejas cristãs. Não seria espanto que, hoje, militares
descontentes e saudosos do tempo em que davam as cartas a seu bel prazer,
encontrassem na IPB apoio irrestrito a um novo golpe militar.
Irritados com o PT no governo, com a
manifestação das minorias pelo reconhecimento de seus direitos, com as
discussões sobre a legalização do aborto, os evangélicos, sinônimos, o mais das
vezes, de conservadores, encampariam sem qualquer pudor um movimento que
viesse, ainda que pela força, “moralizar” o país. Esperamos que 64 não ganhe
vez novamente em nossa jovem e claudicante democracia. Por isso nossa
manifestação.